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Hoje resolvi viajar de novo no tempo e regressar de novo à era medieval para fazer mais uma receita completamente diferente do que estamos habituados.
Segui a receita quase à risca, à excepção do primeiro passo que por o ter acho estranho improvisei, de qualquer das formas aqui não estou obrigada a nenhum rigor histórico.
A pesquisa que fiz há bastante tempo atrás deu-me um enorme prazer e uma quantidade de receitas que sempre que o tempo me permitir serão testadas e postas por aqui.
A origem desta receita remonta à Inglaterra do séc. XIV, é relativamente simples, mas de sabor exótico, a receita original e a tradução para inglês dos nossos tempos está aqui. Mas, para aqueles que só agora visitam o Tertúlia de Sabores, podem sempre espreitar em gastronomia medieval as outras receitas que testei faz um tempo.
Aqui fica a minha versão ligeiramente modernizada de mais uma iguaria medieval, posso dizer que fica muito bom, principalmente para quem gosta de sabores agri-doces.
Coelho em Molho de Vinho Doce e Passas de Uva
(Connynges in Cyrip)
Ingredientes:
Preparação:
A receita manda cozer o coelho em caldo de carne, eu abdiquei dessa parte e alourei-o num fio de azeite, adicionei todos os restantes ingredientes e deixei cozinhar tapado em lume muito brando durante uns 40 minutos, virando o coelho de vez em quando para todo ele tomar sabor, se o molho evaporar rápidamente e o coelho ainda não estiver cozido adicione uns borrifos de água.
Acompanhei com arroz branco, e legumes cozidos. Se quiser, apesar de não ser de todo medieval, também deve acompanhar bem com um puré de batata ou umas batatinhas fritas.
Nota: Como já disse anteriormente quando abordei este assunto , nenhuma das receitas medievais têm quantidades, por isso é necessária alguma imaginação para que os sabores fiquem equilibrados. As quantidades desta e das outras receitas foram calculadas por mim e não quer dizer que sejam as certas.
Não fazia a mínima ideia que a cozinha medieval podia ser tão rica em condimentos, das festas medievais a que fui até hoje, apresentaram-me sempre uma sopa e umas carnes grelhadas. Descobri dezenas de receitas óptimas para o dia a dia, e que não estando obrigada a nenhum rigor histórico posso alterar como melhor me convir.
A casa ficou com um cheirinho a especiarias, que fazia lembrar um pouco os aromas de Natal na Alemanha.
Os doces e massas foram feitos por mim sem o recurso à batedeira por opção minha e saíram dentro do muito razoável. Hoje em dia há os mais diversos tipos de máquinas que batem, mexem, sovam, picam, pesam, cozem, assam e outra tanta parafernália de utensílios, que na minha opinião são óptimos para quem não sabe cozinhar, que me desculpem os adeptos da Bimby, mas eu gosto de pôr a mão na massa e sentir-lhe a textura. Texturas à parte, utilizar uma vara de arames para bater ovos e uma colher de pau para envolver a farinha serviu para exercitar muitos músculos do meu corpo que se encontravam adormecidos.
A nossa escolha
A escolha dos vinhos ficou a cargo do F., excepção feita a um vinho caseiro espanhol que me tinham oferecido há dois anos e que estava esquecido na despensa, e a um vinho francês que também tinha por cá esquecido. A escolha dele baseou-se única e simplesmente por um qualquer sinal que tivesse alguma ligação com o "medievo".
Mas não se assustem não os bebemos todos.
Pormenores do Comenda Grande e do Tapada de Coelheiros
O "Fleur de Grezette" infelizmente estava estragado, para grande pena minha pois já o tinha provado anos atrás sendo um vinho muito agradável da região de Cahors em França.
O "Tapada de Coelheiros" é o que é e não há nada a dizer, sendo que apesar de muito bom foi ultrapassado pelo "Farfalla" vinho de produção particular que um amigo trouxe de Espanha há já algum tempo. Deste vinho ninguém esperava nada, porque o pessoal não está habituado a vinhos caseiros, mas ao provar houve muito bons comentários.
Pormenores do Farfalla
Quando a E. me falou em fazer estes ovos a minha primeira reacção foi dizer-lhe, deixa isso para outro dia, já temos tanto que fazer e isso deve dar imenso trabalho...
A resposta dela foi que tinha trazido ovos caseiros e que queria experimentar porque ia ser divertido.
Quando os vi, pensei... que coisa tão esquisita! O aspecto não é nada representativo do sabor. Pessoalmente achei que não tinham nada bom aspecto, e confesso que de tudo o que estava na mesa foi a última coisa que resolvi experimentar. Posso dizer-vos agora que foi sem dúvida o prato que mais me agradou, a mim e creio que aos outros também.
O seu sabor é de uma simplicidade e ao mesmo tempo de um exotismo difícil de ultrapassar, por isso não se deixem levar pela imagem e experimentem.
Na receita original havia duas opções a E. fez a segunda.
Preparação:
O Hypocras (Ipocras, Ypocras, Hyppocras, Hippocrass) é uma das bebidas da Idade Média. As primeiras receitas conhecidas deste vinho fortemente açucarado a que se adicionam especiarias remonta ao séc. XII e são maioritáriamente da Catalunha e do Langue d'Oc (França).
O seu nome deriva provávelmente de Hipócrates, frequentemente considerado o pai da Medicina, e à bebida estariam associados poderes "curativos".
Este vinho pode ser tomado como aperitivo ou como acompanhamento de sobremesas, especialmente de chocolate e é relativamente simples de se fazer, depois de feito e coado pode ser guardado durante bastante tempo, julgo que vários anos.
Como havia variadissimas receitas de Hypocras, peguei num bocadinho daqui e outro dali e fiz o meu assim:
Hypocras
Ingredientes:
Preparação:
Levei o vinho ao lume a aquecer, em lume brando sem deixar ferver, juntei as especiarias e deixei a macerar de um dia para o outro.
Filtrei o vinho várias vezes e armazenei numa garrafa bem rolhada até ao dia de servir.
A filtragem pode ser feita através de várias gases ou utilizando os filtros de café.
Pode ser feito com a antecedência de um mês ou dois antes de servir, embora digam que ele é melhor passado um ano.
Gostei bastante, embora os restantes comensais fossem de opinião que era demasiado doce e com forte travo a especiarias, coisas que podem fácilmente ser corrigidas consoante o gosto de cada um. Embora seja aconselhado como aperitivo, servido fresco mas sem gelo, desconfio que, à semelhança do ponche ou do Glühwein, será agradável, se servido quente, numa noite fria de Inverno. Mas isto, claro, é só a minha opinião.
A maioria das informações foram baseadas na leitura da Wikipédia e no site Hypocras onde tem inclusive, algumas receitas que usam o referido vinho e de que tenho alguma vontade de experimentar.
Pode encontrar outras receitas de Hypocras aqui e aqui a dificuldade vai estar em escolher uma.
Foram três os doces escolhidos para o jantar medieval, para além do Toucinho do Céu que publiquei há uns dias atrás, tivemos umas peras cozidas em vinho e especiarias e uma Tarte de Bry.
Quando li a receita desta tarte pela primeira vez, em inglês, associei Bry a Brie e por desatenção minha pensei que era uma tarte salgada. Na receita original dizia o seguinte:
No dia em que a confeccionei, acabei por fazê-lo com um simples requeijão, pois achei que seria o mais adequado. Mais uma vez temos o uso do açafrão e do gengibre, que apesar das minhas dúvidas deram à tarte um sabor alimonado e uma cor alegre.
Para a base fiz uma massa quebrada simples, das que vêm em todos os livros, mas que pode perfeitamente ser de compra.
Tarte de Bry
Ingredientes:
Preparação:
Esmagar o requeijão com um garfo, bater os ovos ligeiramente com o açúcar, misturar com o requeijão e adicionar as especiarias.
Pôr numa forma de tarte forrada com a massa quebrada e levar ao forno 15 a 20 minutos a 180º ou até estar com um aspecto dourado.
Nota: Na minha apreciação, a tarte ficou saborosa, mas a massa da base deveria ter ficado mais fina, e devia ter utilizado uma tarteira de diametro mais pequeno para que o recheio ficasse mais alto. Pormenores a rectificar numa próxima vez, porque vale a pena repetir, primeiro porque é saboroso, segundo porque se faz muito rápidamente e sem stresses.